Convergências e assimetrias entre som e movimento

 Como estamos percebendo há momentos em que parece que os movimentos e os sons andam juntos. Essa sincronia é aparente, é construída, é uma expectativa. Como vivemos em uma época audiovisual, somos quase que mobilizados a pressupor que a sincronia entre som e movimento é unívoca, quase que uma lei da natureza.

Mas nem sempre foi assim. Hoje parece bizarro crer que em 1928 cineastas como Eisenstein e V. I. Pudovkin assinaram um manifesto contra o som no cinema. { V. Declaração sobre o futuro do cinema sonoro. In: EISENSTEIN, Sergei. A forma do filme. Rio de. Janeiro: Zahar, p. 225-227, 2002} Ou seja, não há um vínculo direto entre som/movimento/imagem no mundo cotidiano e som/movimento/imagem em obras artísticas. 

Em um primeiro instante, é bem importante perceber que as ações propostas e as ações realizadas em cena passam por fases, por momentos diversos. Há o comando da condução do ensaio, no caso o Flávio Café. Entre esse comando e a realização pelo grupo há intervalos e retomadas diversas. O grupo se apropria da informação verbal e entra em jogo de seguir a informação verbal e atualizá-la fisicamente. Ainda, entre o ouvir e o fazer há o intervalo de indeciões, revisões e mesmo negações. Durante esse intervalo ainda, cada um que faz observa os outros, tentando correlacionar a rubrica(comando verbal) com as ações que serão realizadas e sua comparação e contraste com os outros. 

E é nesse jogo ainda que o som se impõe. A nota ou as notas som. Da mesma maneira que as respostas heterogêneas por meio de movimentos, os sons também passam for fases de hesitação e revisão.  

Em outros instantes, quando o som se reafirma em si, em uma frase, ou um motivo, uma sucessão de escolhas audíveis, ele adquire um plano de atenção e realização, como que se descolando das ações físicas, ou estando simulâneas a elas. Assim temos a sobreposição de planos com perfis diferenciados, com tempos diversos de sua efetivação. 

Vai haver convergência quando as frases ou movimentos das ações físicas encontrarem seus padrões próprios ao mesmo tempo que as frases ou motivos sonoros. 

Então, nesse momento parece haver não uma sincronia entre som e movimento e sim uma convergência de planos performativos. 

Hoje por exemplo, dia 6 de abril, tivemos a possibilidade de experimentar essas assimetrias e convergências. No vídeo, a partir do minuto 55 (55:00), todos estão deitados no chão e a instrução é: "Aí de onde você está, em câmera lenta, quero que vocês cheguem em pé. Vocês têm 25 minutos". 

Em seguida, há uma improvisação sonora com seus motivos enquanto cada intérprete vai por sua conta procurando reagir ao comando. 

Ainda, Flávio anda pelo palco fazendo suas observações verbais, um contínuo sonoro, uma improvisação sobre a câmara lenta. Ele amplia e diversifica o comando. O comando não foi pontual. Assim como o som, o comando ressoa em suas ondas verbais. Entrelançam-se assim as falas de Flávio, os sons da guitarra e os movimentos dos agentes.

A câmera lenta levou os intérpretes aos limites de suas ações. Com isso houve uma dessincronização forçada produzida em cena. 



V. AS REPERCUSSÕES DA CHEGADA DO SOM NO CINEMA, de  Maria Lídia de Maio BIGNOTTO

https://cepein.femanet.com.br/BDigital/arqPics/1911340089P969.pdf

Contraponto audiovisual? De Eisenstein a Chion

De Luíza Beatriz Alvim

Link: https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/revistafamecos/article/download/24688/15209/

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